quarta-feira, 26 de junho de 2013

Reforma Política

Já com atraso, na medida em que os fatos estão se sucedendo mais rápido do que eu esperava, comentarei a tal Reforma Política. E começo com um comentário que assusta até a mim mesmo: sou contrário a voto distrital.
Todo sistema tem falhas, uns mais do que outros. Essas falhas possuem 4 origens possíveis a meu ver: 
- alguma regra foi deliberadamente mal redigida
- alguma regra foi não-intencionalmente mal redigida
- as regras em si são boas, mas o conjunto delas é deliberadamente mal redigido
- as regras em si são boas, mas o conjunto delas é não-intencionalmente mal redigido
No caso do sistema político-eleitoral brasileiro, há falhas dos 4 tipos. Seguem exemplos mantendo a ordem acima:
- distribuição de deputados federais por estado, prejudicando os estados mais populosos
- eleições fracionadas, gerando pleitos a cada 2 anos
- controle de caixa dos partidos
- mecanismo de voto proporcional, possibilitando a existência de "puxadores de votos"
Tem uma lista enorme de coisas erradas. Seguem algumas:
- O voto do paulista vale 1/8 do voto do amapaense nas eleições para deputado federal. 
- Usamos um sistema bicameral chupinhado sem motivo algum do sistema norte-americano sem qualquer vantagem efetiva para o país: o senado, na realidade, não serve para nada.
- Temos deputados demais.
- Temos partidos demais.
- Não é possível a candidatura avulsa: o político é obrigado a ser filiado a um partido.
- O sistema proporcional faz com que votemos em fulano elegendo ciclano.
- Ainda existe voto secreto no Congresso.
Paro por aqui, para não me estender demais na lista. Acho que o leitor pegou o espírito.
Então surge este clamor popular por mudanças, e a tão falada reforma política vem a tona. Muito bom. A presidente vem a público e fala em mudanças constitucionais. Disso surgiu um auê sobre uma constituinte ou uma constituinte específica para reforma política. Isso seria precedido de um plebiscito. Juristas correram a se manifestar contrários à sugestão que já foi abortada ontem mesmo.
Interessante como esses caras se entendem rápido quando querem, não? E eu discordo de todos eles por razões incrivelmente simples.

Primeiramente, citar plebiscito é sempre popular. Tão popular que parece populista. Mas mesmo que a presidente tenha sido populista nesse aspecto, concordo e apoio a ideia dela: o plebiscito daria números científicos a esse mar de achismos que virou a opinião pública. Se 85% das pessoas aprovar o desejo de reformas, ficará impossível não levá-las a cabo.
Segundo é a questão da reforma constitucional. Não li o suficiente para saber se são necessárias mudanças na constituição. Ouvi juristas dizendo que sim e outros dizendo que não, o que já me assusta. Considero todos uns babacas holofoteiros: como podem saber se é necessário ou não mudar constituição se não foi definido o que será mudado ?
O terceiro aspecto que se destaca é a resistência de alguns desses mesmos juristas a uma constituinte. Alegam que a atual carta, datada de 1988 é muito nova. Argumentum ad novitatem.
O quarto ponto é a dita impossibilidade de uma constituinte restrita. Este aspecto eu desmonto com dois tiros de bazuca. O segundo tiro é que mesmo que seja juridicamente impossível, poderia ser feita uma constituinte per si alterando-se apenas o que se refere à forma política (título II se não me engano), copiando e colando todo o resto. Simples! Mas o primeiro tiro, mais divertido de usar, é algo que esses togados sempre se esquecem. Trata-se do parágrafo único do artigo 1o: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição." Se é desejo do povo uma constituinte restrita, cabe a eles acharem uma maneira de fazer e não criar barreiras para impedir, oras.

Para finalizar, e cumprindo minha ameça inicial, falarei porque estou contra o voto distrital puro neste momento, e creio que por não menos que 20 anos pela frente. O voto distrital fraciona o país em centenas de área, cada qual elegendo seu representante, no caso, deputado. Muito se falou no passado que esse sistema favorece a criação dos chamados currais eleitorais, onde o político só precisa controlar aquela fração de eleitores para garantir seu mandato. 
Embora pareça que esse tipo de coisa não faz mais sentido no século XXI, existe sim um tipo específico de indivíduo capaz de se tornar conhecido localmente e de mobilizar uma quantidade elevada de eleitores a votar nele: o pastor.
Neste atual momento, o voto distrital simples transformaria o Brasil em uma república evangélica em apenas uma eleição. E depois disso, amigo leitor, já era. Peça visto canadense e enquanto ele não sai, corra para as montanhas que a coisa vai ficar feia.

Um comentário:

  1. Oi, Norson! Acho que o risco de uma "república evangélica" é maior no sistema atual, proporcional de lista aberta. Nesse tipo de votação, o deputado, para se eleger, precisa cultivar uma "clientela" de eleitores fiéis, que pode ter base geográfica, ideológica, econômica, etc. É por isso, por exemplo, que o Bolsonaro e o Jean Willys são eleitos, assim como a bancada ruralista e a evangélica.

    No voto distrital, a base será, necessariamente, geográfica. Dependendo do recorte dos distritos, é possível que o mix populacional acabe diluindo a influência dos pastores, já que o eleitorado terá uma composição heterogênea do ponto de vista religioso, e todos votando dentro de um mesmo distrito.

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