sábado, 16 de fevereiro de 2013

Dissonância Corgnitiva (2)

Dando seguimento ao tema iniciado aqui, vamos ver agora as distorções de ração.
  • Reações Distorcidas
São várias, e não pretendo cobrir todo o espectro de possibilidades. Mas aqui vão as principais que podemos observar no dia a dia.
1) Substituição apressada - ocorre quando a pessoa rapidamente aceita a nova informação em detrimento da antiga. O exame da informação nova não é detalhado ou cuidadoso. Acontece quando a pessoa tem dificuldade em fixar sua opinião ou quando a fonte da informação nova exerce algum tipo de poder sobre o alvo. Quando utilizada com má fé, é o que chamamos de manipulação. Esse caso é comum em meios de comunicação.
2) Deleção apressada - caso oposto do anterior, a pessoa rapidamente descarta a informação nova para manter a antiga. Não é feito nenhum exame da informação apenas e tão somente porque ela parece conflitar com o que está "instalado" na mente. É curioso notar que muitas vezes a informação nova sequer conflita de fato com a antiga, mas a deleção apressada impede uma boa análise. Esse caso é comum em religiões.
3) Racionalização - talvez o mais comum dos fenômenos distorcidos, é a busca por desculpas (não raro esfarrapadas: ver GDE) para fazer o cérebro se conformar. É bastante comum no dia a dia, quando vemos as pessoas terem práticas diversas dos seus próprios discursos.
4) Explicações estranhas - diferente da racionalização, a explicação estranha se utiliza de falácias para comprovar que os fatos ainda se ajustam às crenças e valores da pessoa. É uma espécie de vale tudo mental, onde o que importa é fazer a mente se sentir menos confusa ao final do processo.
5) Confusão e reações emotivas - neste caso as duas informações permanecem ativas e colidindo o tempo todo na mente da pessoa, por períodos prolongados até. É o que acontece, por exemplo, com o torcedor de futebol que acredita piamente torcer pelo melhor time do mundo frete a uma derrota ou rebaixamento. Ele vai às lágrimas não pela tristeza da situação, mas por não ser capaz de aceitar o ocorrido.
  • Leve x Intensa
O peso da dissonância tem relação com principalmente 3 aspectos: 
1) o quão divergentes são as informações
2) o quão arraigada é a informação antiga
3) flexibilidade mental da pessoa
Um pessoa que apenas confundiu o nome de um colega que conheceu ontem pode até rir de si mesma pela confusão e rapidamente se adapta ao cenário novo. Um tabagista confrontado com uma suspeita de câncer já é algo mais complicado, podendo levar o paciente a buscar outro médico por exemplo. Mas quando temos uma evidência física confrontando um dogma religioso, a coisa complica. 
Reações como explicações estranhas e deleção apressada podem vir acompanhadas de efeitos colaterias variados (ver a seguir) que, combinados, criam quadros que variam do rizível ao dramático, sem deixar de passar pelo perigoso.
  • Efeitos colaterais
Quando uma pessoa passa por uma dissonância cognitiva muito intensa, o desconforto mental é grande e estressante. Confrontar um dogma religioso capenga com uma realidade bem estabelecida não tem como ser um processo agradável. Pessoalmente, eu tenho pensado muito nesse aspecto ultimamente.
Pensemos, por simplicidade, em uma pessoa em vias de perder seu emprego. Ela percebe as dificuldades profissionais no dia a dia. A empresa pode estar mal financeiramente, ou ser um problema pontual como desentendimentos constantes e crescentes com colegas e chefes. Essa pessoa fica agitada, sensível, irritadiça e muitas vezes explosiva. O grau com que isso acontece depende demais da personalidade, mas uma explosão verbal de xingamentos, ofensas e palavrões não deixa de ser encaixar nessa categoria. Cada um de nós e cuidadoso, paciente e até permissivo com pessoas nessas condições, não ?
O versão um pouco mais séria é a da evidência que confronta o Bom Senso (lembra que eu prometi bater nele ?). O bom senso (common sense em inglês, que está mais para senso comum do que bom) é aquele conjunto de conhecimentos que, aparentemente, é estável de pertencente a todos. Só que nem por isso ele está certo. O Bom Senso rege uma série de coisas que não raro são falsas, erradas ou ineficazes. Pode-se encontrar material extenso sobre isso no trabalho do economista Steven Levitt. 
Mais um exemplo bastante palpável é o da traição conjugal. A reação da pessoa traída não é de tristeza: na maioria dos casos, o relacionamento já tinha sido percebido como problemático muito antes da descoberta da traição. A pessoa não está triste por ter sido trocada, está surpresa. A descoberta leva à dissonância cognitiva: a pessoa que era de confiança, de repente, não é mais. E não é preciso listar aqui as reações por vezes violenta e trágica que esse cenário produz.

Conclusão

Pois o processo de dissonância cognitiva severa segue, portanto, a mesma linha da versão leve. E por isso que vemos discussões futebolísticas, políticas e religiosas saírem de controle com facilidade. E é disso que vou falar agora: a dissonância dogmática.
A pessoa religiosa muito dogmática não conseguirá se adequar à realidade dos fatos. Não adianta você mostrar para o sujeito que não há na Bíblia uma linha sequer que condene de fato o homossexualismo: o sujeito acha que tem e não vai aceitar o casamento gay. Não aceitar os fatos é decisão dele, mas o choro, a raiva e a agressividade não são
Isso é importante tanto para quem vive a dissonância quanto para quem a cria. Este precisa estar preparado para ouvir o que não quer e o que não merece, e reagir a isso com o cuidado que a situação e o interlocutor merecem. Para aquele, é preciso um momento de autocrítica quando a verborragia acontecer: é um sintoma claro que algo está errado em seus dogmas, visões e valores, e uma parte da mente se deu conta disso e está iniciando um processo de evolução.
É muito comum a pessoa passar à negação nesta fase. Vai racionalizar, defender seu ponto vista, defender seu direito a ter um ponto de vista. De novo, a agressividade depende da personalidade. Mas de um modo geral, ela fará de tudo para não mudar. Esse é o erro.
Deixe a mudança acontecer


2 comentários:

  1. Nenhuma mudança numa pessoa, ideológica ou comportalmental, pode ser imposta. Querer forçar a mudança torna o processo mais doloroso e algumas vezes impossível, como dito inclusive na teoria da Dissonância Cognitiva.

    Outro ponto é que, como provado em diversos estudos sobre alcoolismo e outros hábitos prejudiciais é que, sem um algo a mais que mantenha a pessoa firme em seu novo sistema de crenças/hábitos, a pessoa instintivamente SEMPRE retorna para o que é mais "familiar" (novamente, Tony Dungy sabe disso melhor do que ninguém).

    Diversos estudos mensuram esse algo a mais, mas é interessante notar que, por discordar do que as conclusões dos estudos indicam, muitos fatos cientificamente provados foram desconsiderados para que algumas crenças (ou melhor dizendo, o hábito de crer nelas) não fossem afetadas.

    Resumo da ópera: quem fala o que quer, ouve o que não quer de fato, e normalmente o erro é exclusiva de quem disse o que queria...

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  2. Bem observado. O link entre este tema e a internação compulsória não era intenção da minha parte, mas agora se tornou inegável.

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