quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Mais sobre internação compulsória

Prossegue o mimimi a cerca da internação compulsória de dependentes químicos. Iniciei o assunto aqui, mas claramente ainda há bastante pano para manga.. A estratégia dos que são contra, os antis, é levantar depoimentos de pessoas recuperadas que que passaram por isso e concordam com eles. Curioso como não se busca o outro lado da moeda, não ?
O maior argumento deles é que o ex-usuário vai voltar às ruas sem perspectivas e retornará às drogas. Na essência, até acho que isso vai acontecer sim em muitos casos. Mas o argumento é totalmente falso por vários motivos.
Primeiramente, isso me parece um dicto secundum quid ad dictum simpliciter, também conhecida como falácia da generalização apressada.O fato de alguns ou mesmo a maioria dos internados retornar ao vício não implica que a internação compulsória nunca funcione. E no estado atual das coisas, mesmo uma porcentagem baixa de recuperação é interessante. 
Em segundo lugar, há uma falácia de falsa dicotomia sobre as consequências da internação compulsória. Os antis vêem apenas duas opções: o usuário se cura ou retorna ao vício. Simplista, esta visão desconsidera o meio termo do usuário que tem a recaída, mas já em um nível diferente de conscientização. Claro que não se deseja isso, mas quem sabe em algum tempo ele tenha condições de sair mesmo do vício na próxima internação, compulsória ou não. Os antis fingem que isso não ocorre. Curioso é que alguns antis passaram eles mesmos por esse processo. 
Em terceiro lugar, joga-se a carga toda da solução do problema nas costas do Estado. É certo que o Estado tem sua parcela de culpa ao ter permitido, ainda que não intencionalmente, o tráfico de drogas. Mas a decisão de experimentá-las, de repetir e até de largar estudos ou empregos foi do governador? Do secretário, do prefeito? É muita infantilidade terceirizar culpas
Por último, temos uma falácia de causa diminuta e uma falácia de definição muito ampla sobre o início do vício. Sim, há pessoas sem oportunidades. Sim, há pessoas sem oportunidades que entram no vício e terminam de destruir suas vidas. Mas o fato é que, além de não se definir com precisão o que diabos é "uma pessoa sem oportunidade", ainda temos o fato de muito, maioria esmagadora, dos que se encaixam em qualquer variante desse definição não se tornarem usuários de drogas de qualquer tipo.
O que os antis não parecem perceber é que a internação compulsória trará algum resultado. Recuperará algumas pessoas. Será benéfica, embora não resolva o problema todo. Pergunto até se eles são da turma do "quanto pior, melhor", pois não vejo da parte deles qualquer tipo de sugestão ou crítica construtiva ao projeto.

5 comentários:

  1. Um rápido pensamento sobre minha visão conspiratória do assunto:
    - O governo está permitindo que o judiciário e a policia pense pelo usuários de drogas

    - estamos próximos a eventos internacionais ou seja, necessitados de uma cidade limpa, e com menos atestados de abandono humano.

    - Essa medida será adotada em outros Estados em breve (interessante observar que no Rio de Janeiro os próprios traficantes agora proíbem o uso de crack, pois esse mata o usuário muito rápido) e não sei o porque mas em breve acredito eu que essa medida será adotada não só para esse tipo de drogas ilicitas e se transformará na arma do governo para controlar os desafetos. (voce não está em sua sanidade mental governamental, logo está louco e por isso será internado.)

    Será que veremos a contrução de MegaCity o cenário de Juiz Dredd no Brasil? Será?

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  2. Como eu disse, a atitude é válida, mas não resolve nada.

    Sobre o vício eu creio que posso opinar com mais conhecimento de causa do que a maioria. Explico: todo mundo tem algum conhecido ou parente ou ambos que são viciados. Eu não fujo à regra. Porém, poucos conhecem alguém que tem ou trabalha numa clínica de recuperação de viciados. Meu pai tem uma clínica dessas, e eu já trabalhei lá diversas vezes.

    Minha experiência pessoal nesse assunto condiz com todos os estudos que li a respeito do assunto: dentre todos os que experimentam ou até chegam a usar frequentemente drogas, o número de pessoas que efetivametne se vicia é muito baixo. Para a cocaína, e por tabela o crack, o percentual é abaixo dos 20%. E não, pelo amor de Deus, não existe prova científica nenhuma de que mudar a forma de consumo de uma droga cause mudança nesse número (vemos mais viciados em crack porque, ao contrário da crença popular, ele é mais barato).

    A grande maioria das pessoas que usaram drogas ou não gostaram ou são capazes de usar sem se viciar, parando a hora que quiserem. O motivo disso não está bem mapeado, mas a maior suspeita é predisposição genética (mas considere que predisposição genética é a virose das ciências biomédicas, e em 99% dos casos esse é um argumento não-científico porque, mesmo quando ele está correto, é um argumento impossível de ser medido e/ou provado).

    Uma explicação rápida do que as clínicas fazem: elas ajudam o viciado a aprender a criar mecanismos que façam ele procurar outra coisa que não as drogas sempre que bater a vontade (o método do "mantenha a deixa e a recompensa, mas mude a execução para alterar o hábito com mais facilidade"). Por isso que muito ex-viciado fuma, por exemplo.

    Mas só identificar os hábitos destrutivos e mudá-los não é suficiente. Genética e Psicologia concordam, e explicam, que mesmo se seus hábitos mudarem, em momentos de stress muito elevado, você VAI voltar aos velhos hábitos e isso vai colocar todo o seu trabalho de a perder. Tony Dungy sabe disso melhor do que ninguém.

    Qualquer visita ao maior e mais eficiente grupo que se propõe a alterar hábitos do mundo, os Alcoólicos Anônimos, sabe o que é necessário para fixar um hábito novo e mantê-lo, mesmo sob forte stress. E isso fica bem óbvio nos famosos "12 passos" deles.

    Voltando à pauta: a idéia de que se você tratar o viciado e depois soltar ele na rua vai ter como resultado lógico ele voltar a usar drogas está certa. Ele pode ficar limpo por um tempo mas no primeiro momento de stress (ou às vezes até antes disso) ele vai voltar para as drogas. Isso é tão verdade que, depois de limpos, os viciados com um pouco mais de bom senso pedem para continuar na clínica, internados ou trabalhando, porque sabem que se voltarem para suas antigas rotinas (e aqui não estou falando das ruas, estou falando da rotina antiga da pessoa, seja ela qual for) ele inevitavelmente VAI se drogar.

    A conclusão disso é o início do comentário: a iniciativa da internação compulsória é boa, mas sozinha ela não resolve nada. Algo mais precisa ser feito, e algo a longo prazo. Porque da mesma forma que quem olha para resultado do Bolsa-Família hoje está fazendo um julgamento precipitado do projeto, quem olha para o resultado imediato do internamento compulsório está vendo algo que, a longo prazo, é irrelevante.

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    1. X, acho que, no fundo concordamos. A Internação Compulsória não resolve tudo, mas ajuda.
      Podemos resumir assim ?

      Sobre o BF, falarei em outra oportunidade.

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  3. Podemos. A única ressalva que eu faço é a que eu fiz no final do comentário: só isso, a longo prazo, é inócuo.

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  4. Norson e X, concordo com vcs. Conheci uma pessoa diagnosticada com dependência química, ele era usuário de cocaína, mas no desespero do vício usou de tudo. Ele diz que soube aproveitar os pontos positivos da experiência, aprendeu a se alimentar melhor, descobriu uma série de remédios que não podeira tomar nunca (imagina uma pessoa que pode entrar em choque com aspirina), e através da terapia conseguiu se estabilizar emocionalmente.
    Mas como o X ressaltou, ele teve que trocar de vida, nunca mais viu ninguém ligado à época de dependência e continuou no centro palestrando e auxiliando pessoas que passaram pelo mesmo problema que ele.
    Independente da parcela de pessoas que se viciam de fato, a internação é indispensável. Alcoólicos Anonimos e até Vigilantes do Peso usam a mesma teoria, não deixe nunca de se policiar, porque quem é viciado sempre vai ter problemas com o objeto do seu vício, e os grupos ajudam muito a manter a pessoa focada e equilibrada para não reicindir. Pode parecer menor assaltar a geladeira na calada da noite, e por uma série de fatores é muito mais simples para o indivíduo reconhecer a necessidade de tratar sua compulsão por comida do que a necessidade de se afastar do vício em drogas.
    Quanto a abrir uma brecha para se obrigar qualquer um a ser internado por motivos políticos ou de qualquer outra ordem,sim, há uma chance de acontecer. Mas acho que não devemos deixar de fazer o que é certo e necessário por alguém que está impossibilitado de cuidar de si mesmo por nossa inépcia em escolher e controlar nossos administradores públicos.

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